sexta-feira, 28 de março de 2014

Escritos escondidos da noite (a verdade)



   Na calada da noite, sinto a cidade adormecer. Sei que alguns ficarão acordados escondendo-se na escuridão; talvez eu esteja com esses, mas diferente dos demais escrevo no meu diario os meus sentimentos e as minhas duvidas que em mim se escondem. Meus familiares dormem e não sabem que estou acordado ou talvez saibam quando a noite levantam para tomar àgua e ir no banheiro, porém eles esperam que a verdade seja que eu esteja dormindo, eles levatam e dizem:
     - Carlos vai dormir, amanhã você levanta cedo!
     Sei que eles se preocupam com meus estudos, com a minha saúde, com minha vida no geral, mas não se importam para minhas dúvidas e sentimentos, acham que o amadurecimento trará as respostas ou mesmo Deus ou qualquer outra coisa espiritual. Se ao menos eu acreditasse em alguma dessas coisas...
     Sempre me questiono em relação a verdade e a sinceridade, pois todos dizem que devemos ser verdadeiros a todo instante. Então, decidi sempre falar a verdade em qualquer que fosse a circunstância, quer doesse quer não, seria sincero e verdadeiro.
     Estava eu no primeiro dia e já encontrei uma simples dificuldade, era apenas um telefone tocando e uma empresa vendendo um produto qualquer, nem me lembro ao menos qual era o produto, mas lembro da reação do meu pai que ao ouvir que queriam falar com ele. Meu pai gesticulou de todas as formas possíveis dizendo que não estava; porém estava desafiado a fazer o que chamam de certo e disse ao atendente que ele estava e para aguardar um minuto. Meu pai atendeu e olhou muito feio para mim, após alguns minutos meu pai desligou o telefone e me chamou. Tivemos uma pequena conversa o qual dissemos:
     - Filho, por que você não disse que eu não estava como te pedi? Com um tom de desapontado.
     - Você sempre disse para sempre falar a verdade!
     - Sim filho, eu disse, mas às vezes...
     - Às vezes? (interrompi a frase do meu pai) sempre não é sempre?
     - Sim, sempre é sempre, mas há momentos é necessário mentir.
     - Mas pai, mentir não é errado?
    - Sim, é! Na verdade Jesus disse que o pai da mentira é o Diabo e se nós somos da verdade devemos falar a verdade.
     - Então por que queria que eu mentisse?
     - Eu errei filho, me desculpe. Não queria ter que falar com o vendedor no telefone.
     Meu pai triste e desconfortavel virou as costas e foi continuar o que estava fazendo, pareceu que queria passar alguma coisa a mais, mas não o fez, talvez tenha sido que eu tenha tocado em seus principios e isso me fez estar certo. Apesar de tudo, sabia que teria outros momentos daquele.
     Dias depois, estava eu feliz com meu novo estágio, não era bem o que eu queria, porém ele não atrapalhava meus estudos. Fazia um serviço de atendimento na faculdade que eu estudava. Sempre tive a politica de tratar bem mesmo aqueles que eu não gostava e nunca respondi mal a ninguém. No entanto, me doia o coração quando a secretária ou o diretor pedia para não falar que eles estavam lá. Não tinha o que eu fizesse, sempre respondia que eles estavam lá e que não podia atender. Não era problema falar que eles estavam lá, mas sim quando um professor ou um coordenador entrava com tudo já que tinha algum assunto urgente (na maioria das vezes nem era tão urgente assim), não sabia o que dizer para eles, até expus a verdade para a secretaria que devido a sua religiosidade entendeu, porém ela mesmo não cumpria.
     Na quarta-feira daquela semana que entrei no estágio, meus amigos André, Vitor e Jonas, ambos da mesma igreja que eu frequentava (sim, antes eu era uma pessoa muito religiosa, um daqueles que era exemplo, porém desilusões me fizeram sair e nem mesmo acreditar em deidades)  conversamos entre si dentro da igreja até que o assunto chegou nas mulheres. Assunto que interessa jovens de todas idades. Porém, para mim aquele assunto estava me deixando muito desconfortavel, já que André falava dos diversos relacionamentos que teve e como é gostoso a sensação de beijar, ele recordava daquela sensação como se estivesse com ela, gesticulava e sentia prazer ao lembrar, no entanto foi quando ele perguntou a cada se tinhamos beijado alguma vez na vida que me deixou desconfortavel. Antes de ser um membro verdadeiro da igreja eu tive um relacionamento com um rapaz e ele era o único que tinha beijado já que eu tinha a politica de ao menos experimentar antes dizer não e a oportunidade tinha ocasionado, apesar de tudo era passado, antes de cristão me tornar. Seria tudo bem se apenas ficassemos nisso, pois respodi a ele:
     - Sim, eu ja beijei uma pessoa.
     - E não é gostoso? Retrucou André.
     - Não posso te dar a certeza, faz anos que isso aconteceu.
     - E como ela era? Você se lembra do nome dela?
    Essas duas perguntas me colocou em xeque, eu tinha que responder rápido, porém em minha mente ficava a seguinte dúvida: ser verdadeiro e falar que foi um homem e ter olhos tortos para mim (possivelmente dos meus familiares que ficariam sabendo) além de diversos questionarios que fariam a mim ou simplesmente mentir e ficar em paz com uma mentira? Hoje enquanto escrevo, reflito no momento e penso em diversas respostas. Sei que naturamente mentiria, preservaria aquilo que achava moral para aquele circulo de amigos sem ao menos me importar. Após a pergunta do André, enquanto pensava em uma resposta, recordei-me daquele momento como se todas as memórias tivessem retornado, sabia das suas características e seu nome, ele se chamava Reginaldo, mas ele pedia para chamá-lo de Regis foi momentâneo em uma praia, apenas dois dias que passaram e nunca mais o vi. Nada aconteceu demais, apenas beijos, mas o suficiente para me desconfortar no momento da pergunta. Lembrando disso respondi ao André:
     - Ela se chamava Regina, tinha cabelo preto e olhos castanhos.
     Me senti mal naquele momento, tinha mentido, eu que sempre falaria a verdade, eu que jamais mentiria, menti por causa de uma moralidade, por causa do medo, por não ser aceito e ter que responder e passar por processo de pessoas que jamais aceitariam esse tipo de relação. A conversa continuou e meus amigos falavam das moças da igreja, eu já nem me importava mais com a conversa, comentava uma coisa ou outra para dizer que estava lá, mas nada importante.
     Poderia utilizar outros exemplos que passei na vida, mas não acho necessário até porque é apenas um diário o qual apenas eu mesmo lerei, saliento apenas que essa atuação minha me afastou dos meus familiares e dos meus amigos, alguns diriam que se afastaram de mim porque não eram verdadeiros amigos. Isso de certa forma concordo com alguns, mas outros sinto de ter perdido, bem provável que voltemos a ser amigos, mas algumas sinceridades machucaram bastante; sei que podia ter ocultado, até porque não é errado ocultar, mas podiam também não me perguntar. O que concluo com tudo isso é a necessidade de mentir, as pessoas se sentem bem em acreditar em uma mentira como meus familiares se sentem bem ao pensar que estou dormindo, que apenas gosto de mulheres, que acredito em Deus, que sou uma pessoa dedicada e na verdade não sou nada disso, sou apenas um jovem normal que tem suas dúvidas e experiências, e que, nessas experiências descobriu que é necessário mentir, pois a grande verdade é que a realidade entristece as pessoas e para que não se suicidem de depressão as pessoas acreditam em mentiras para que seus principios sejam verdadeiros e possam alcançar seus sonhos. No fim descobri que ninguém esta preparado para a verdade, pois ela só deve ser usada quando convém.
     A verdade na verdade é uma grande mentira.

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